A apresentação do pianista e fadista português Mario Moita, na noite da última quarta-feira, 09, no teatro Therezinha Petry Cardona, extrapolou o simples espetáculo musical. Ao longo da apresentação, Moita levou os espectadores a uma viagem por Portugal, conhecendo um pouco da história e da ligação da nossa pátria-mãe com o Fado.
Canções antigas e recentes, algumas conhecidas do público brasileiro, outras surgindo como agradáveis novidades. Assim, ao longo de quase uma hora, Mario Moita conquistou os montenegrinos, que a despeito de uma noite fria de pré-inverno, compareceram ao espetáculo proporcionado gratuitamente pelo SESC.
Antes do show, Mario Moita concedeu entrevista, na qual conta o motivo das sete tournées em três anos pelo Brasil. Ele destaca ainda o ‘novo fado’, a redescoberta da juventude lusitana pelo tradicional ritmo português. A seguir, a entrevista:
Pergunta: O fado identifica Portugal em qualquer parte do mundo. Como está sendo a receptividade do povo brasileiro com o fado em suas apresentações?
Mario Moita: A receptividade tem sido muito grande, porque o Brasil, segundo um estudo que eu li, tem cerca de 70% de sangue português. Então tem uma forte ligação nossa cultura. Só que hoje em dia, no Século 21, não há o conhecimento da música regional atual de Portugal.
Pergunta: Em uma entrevista que o senhor concedeu a um jornal português, foi destacado que houve um estranhamento quando o senhor colocou piano no fado. O senhor entende que é uma tendência natural usar outros instrumentos em ritmos mais tradicionais?
MM: Portugal é um país muito conservador, então quando há qualquer coisa estranha, já ninguém gosta. O caso do fado ao piano, eu não inovei, apenas fui buscar uma tradição antiga, de 1870, e coloquei-a nos dias de hoje, com os fados atuais, não com os fados de 1870. Também tive a preocupação, a esta altura, de fazer uma pesquisa sobre toda esta história, e lançar, não um cd, mas um livro-cd, sobre a história do fado ao piano, e onde? No Museu do Fado. Então, eu estou tranqüilo, porque os puristas do fado, quando eles começam a falar, eu digo: você não sabe a história. Vá ao Museu do Fado e se informe. Então agora sou respeitado pelos puristas, que tocam o fado com a guitarra portuguesa e o violão.
Pergunta: Esta não é primeira vez que o senhor vem ao Brasil, não?
MM: É a sétima tournée em três anos. Agora em maio fez três anos que eu fui convidado para representar Portugal num festival muito grande em Brasília. Para minha surpresa, encontrei, não um país, mas um continente enorme que fala português, e que não conhece quase nada da nossa cultura portuguesa. Estranhei bastante, porque esperava encontrar um Brasil que conhecesse Portugal como Portugal conhece o Brasil. Desde a novela Gabriela Cravo e Canela, neste momento há cinco ou seis novelas por dia, como no Brasil, e aí vem a cultura, vem a música, vem tudo atrás. Os grandes cantores do Brasil se apresentam em Portugal, você vai comprar um cd, tem uma seção especial só de música brasileira, e isto não se encontra aqui no Brasil. Foi isto que eu pensei com meus produtores, tentar fazer uma ponte que não existe e dar uma pequena contribuição com minha música para o Brasil de hoje em dia.
Pergunta: Fale mais do ‘novo fado’.
MM: Nós assistimos, hoje em dia, a um fenômeno de reavivamento do fado, cantado por novas gerações. Havia uma altura que não existia isso. Após a revolução de 1974, o fado era considerado uma coisa fascista, o que era incompreensível, porque o fado é cultura, não tem nada a ver com política, é a expressão de um povo. E hoje em dia nós temos muitos artistas novos, da minha geração, que estão levando o fado a um patamar mais comercial, e a ‘gurizada’ – como vocês falam cá – estão ouvindo fado, o que é uma coisa fantástica.
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falasefatos.com.br
quarta-feira, 9 de junho de 2010
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PERFIL
ResponderExcluirMário Moita nasceu a 9 de Fevereiro de 1971. Desde novo recebeu formação em piano. Natural de Reguengos de Monsaraz é casado e tem uma filha. Licenciou-se em Zootecnia na Universidade de Évora, e após uma fugaz experiência relacionada com a formação académica decidiu enveredar pelo mundo da música em exclusivo. Tem três discos editados, dois de música popular, mas com o mais recente, ‘Fado ao Piano’, decidiu investir numa carreira nacional e internacional.
A grande batalha de Mário Moita, músico alentejano natural de Reguengos de Monsaraz, é mostrar ao Mundo uma faceta menos conhecida da canção nacional – o fado ao piano.
Com um trabalho editado recentemente, o artista tem mostrado em vários países o fruto de anos de investigação na área e atribui ao pianista Fortunato Murteira a razão de ter apostado neste estilo. Era dele o espólio de partituras de fado para piano que Mário Moita herdou.
Recorde-se que Fortunato Murteira passava para a pauta as melodias de Alberto Janes que se transformaram em alguns dos mais famosos fados interpretados por Amália Rodrigues como ‘Foi Deus’ ou ‘Vou Dar de Beber à Dor’.
Com este espólio investiu e editou ‘Fado ao Piano’, lançado em Abril passado, no Museu do Fado em Lisboa. “O fado ao piano tem aberto portas em todo o Mundo. Sendo eu artista independente, tive que apostar em algo diferente para poder ser reconhecido”, explicou ao CM Mário Moita, destacando a sua especial ligação ao Japão, onde actua todos os anos desde 2001, paragem de uma agenda que engloba espectáculos nos cinco continentes.
Só no mês de Novembro, Mário Moita actuou no Brasil, em Portugal em Itália e no Japão, onde, aliás, está hoje, o que significa quatro países em três continentes, em menos de um mês. Para 2008 tem previsto o lançamento do CD em vários países.
ORIGEM DO GÉNERO
O fado ao piano surge em 1870, quando os marialvas de Lisboa se conseguiram infiltrar nas vielas e ruas proibidas da capital. Aí ouviram o que era na altura uma canção proibida: o fado.
Levaram-na para os salões da fidalguia onde as senhoras de então, ao piano, só tocavam modinhas ou música clássica e sempre a partir de partituras. Foi então que se começaram a passar as melodias do fado para as pautas, posteriormente compradas pelas intérpretes da nobreza. Ou seja, passou das ruas para os salões.
“São três as novidades que apresento. Os estrangeiros só estão habituados a ouvir mulheres a cantar fado, como ouviram Amália ou, mais recentemente, Mariza. Depois, mostro a vertente romântica e não a faceta triste da canção nacional, e ainda a variação nos instrumentos utilizados”, adiantou Mário Moita que, em conjunto com o CD, lançou um livro que conta a história do género.
http://www.portugalvivo.com/spip.php?article2804